sexta-feira, 27 de julho de 2012

A visão das obras de Deus produz paz e esquecimento.



Oração do Viandante
Alma  cansada, abatida na margem do caminho, para um instante na eterna trajectória da vida; e larga  o fardo das tuas expiações e repousa.
Ouve  como está repleta de harmonias a obra de  Deus! O ritmo dos fenômenos irradia doce e grandiosa música. Por meio das formas  exteriores, os dois  mistérios -  da alma e  das coisas - observam-se e sentem-se. Do teu âmago, o Espírito ouve e compreende. A visão das obras de Deus produz paz e esquecimento. diante da divina beleza da criação, aquieta-se a tempestade  do coração; paixão e  dor adormecem em lento e  doce canto  sem fim. Parece que a mão  de Deus através  das harmonias do  universo, acalenta, qual brisa confortadora, tua fronte prostrada pela fadiga, e aí se detém como uma carícia. Beleza, repouso da alma, contato  com o divino!  Então, o viandante  deprimido reanima-se com renovado pressentimento de sua meta. Não parece mais tão longa a  jornada, tão comprida, quando se para um instante, para dessedentar-se numa  fonte. Então a alma contempla, antecipa, e alivia-se na caminhada. Com o olhar fixo no  Alto, é mais fácil  retomar em seguida o caminho cansativo.
     Na estrada dolorosa, para, enxuga tua lágrima e ouve. O canto é imenso, as harmonias chegam do infinito para beijar-te a fronte, ó cansado viandante da vida. Ao lado do trovão das vozes titânicas do universo, murmuram num sussurro de beleza as delicadas vozes das humildes criaturas irmãs: “Também eu, eu também sou filha de Deus, luto e sofro, carrego meu peso e busco minha vitória. Também eu sou vida, na grande vida do todo”. E tudo, desde o fragor da tempestade, até o canto matutino do sol, do sorriso do recém-nascido ao grito dilacerante da alma, tudo, com sua voz, revela-se a si mesmo e sintoniza com as vozes irmãs; tudo exprime seu mistério íntimo; cada ser manifesta o pensamento de Deus.
Quando a dor atinge as mais íntimas fibras de teu coração, ouves  uma voz que  te diz:  Deus; quando a carícia do crepúsculo te adormece no sono silencioso das coisas, , uma voz te diz: Deus. Quando ruge a tempestade e a terra treme, uma voz te diz: Deus! E  essa estupenda visão supera qualquer dor.
      Para, escuta e ora. Abre os  braços  à criação  e  repete com ela: "Deus, eu te amo"! Tua oração, não mais admiração assustada pelo poder divino, agora é mais elevada:: é amor. Oração doce, que brota como um canto que a alma repete, e ecoa de fraga em fraga por toda a terra, de onda em onda pelos  mares, de estrela em  estrela pelos espaços infinitos. É a palavra sublime do amor, que as unidades colossais dos universos repetem contigo, em uníssono com  a  voz perdida  do último insecto,  que, tímido, se esconde entre  a grama. Parece perdida, e no entanto, Deus a conhece também ,a recolhe e ama.  No infinito  do espaço e do tempo, somente esta força, essa  imensa onda de amor, mantém tudo compacto em harmónico desenvolvimento de forças. A visão suprema das últimas coisas, da ordem em que caminham todas as criaturas, dar-te-á sozinha um sentido de paz; de verdadeira paz, de paz profunda, de alma saciada, porque percebe sua mais elevada meta.
     Assim Deus afigura-te  ainda maior  do que em  seu poder de Criador, afigura-te na potência de Seu amor. Explode, ó alma; Não temas ! O novo Deus da Boa-Nova do Cristo, é bondade; não mais os raios vingativos de Júpiter, mas  a verdade que  convence, o carinho que ama e perdoa. O abismo infinito que olhas assustado não está lá para engolir-te nas trevas do mistério, abre-se cheio de luz, e no âmago canta sem fim o hino da vida. Lança-te afoito, porque nesse abismo reside o amor. Não digas: “não sei” dize antes : “eu amo!”.
      Ora! ora diante  das imensas obras de  Deus; diante a terra, do mar, do  céu. Pede-lhes que te falem de Deus; pede aos efeitos  a voz da causa; pede aos que as anima a toda. E todas as formas se aglomerarão em redor de ti; estender-te-ão  seus braços fraternos, olhar-te-ão com mil olhos feitos de luz, e o eterno sorriso da vida te envolverá como uma  carícia. Essas mil vozes  dirão: "Vem, irmão;  sacia teu olhar atroz e tenaz é sempre digna de ser vivida”. E, tomar-te-ão pelo braço, gritando: "Vem; atravessa o limiar e olha o mistério. Vê : não podes morrer; jamais, jamais morrer. Tua dor passa e com ela sobes, e fica o resultado. Não temas a morte nem a dor: não são o fim, nem o mal, são o ritmo da renovação e caminho de tuas ascensões. A vida é  um cântico sem  fim. Canta connosco, canta com toda a  criação o canto infinito do amor".
 Ora  assim, ó alma  cansada: " Senhor! bendito sejas, sobretudo pela irmã dor, porque ela me aproxima de Ti. Prostro-me diante de Tua  imensa obra, mesmo se nela minha parte, é esforço. Nada posso pedir-te,  porque tudo já é perfeito e justo em  Tua criação, mesmo meu sofrimento, mesmo a minha imperfeição transitória. Aguardo no posto de meu dever o minha maturação. Repouso em  Tua contemplação”.
   Responde, ó alma, ao imenso amplexo, e verdadeiramente sentirás Deus. Se a inteligência dos grandes prostrar-se e venera, curva-se diante o poder do conceito e de sua  realização, e aproxima-se do divino  pelas cansadas vias da mente, o coração dos humildes atinge a Deus pelos caminhos da dor e do amor. 
Sente-O pelas estradas dessa sabedoria mais profunda.
 Ora a Deus assim, ó alma cansada. Reclina a tua cabeça em Seu peito, e repousa..
Pietro Ubaldi - Extraído do livro "A Grande Síntese"
Cap. LXVI

 ..esta oração quando bem traduzida é de uma beleza que supera qualquer comentário; - será demais afirmar que aqui se percebe uma "certa mediunidade redentora do autor...!

Sem comentários:

Enviar um comentário